segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

O que está em causa em 2015/16

No início da temporada, os “três grandes” partiram, contrariamente ao que se poderia concluir do repetitivo e desinteressante discurso politicamente correcto tão comum entre os diversos agentes desportivos, em desigualdade de circunstâncias.

O Benfica apresentou-se bicampeão nacional, dispondo de uma margem de manobra raramente concedida pela generalidade dos seus adeptos. Refiro-me concretamente a uma certa imunidade actual dos benfiquistas em relação à pressão mediática, ao desempenho desportivo da sua equipa a curto prazo e a incertezas quanto à qualidade da equipa técnica e do plantel, com um novo protagonista no primeiro caso e profundas alterações no segundo ao longo dos últimos três anos. A implementação de uma nova política (a aposta na formação com repercussões no investimento e na massa salarial, que diminuíram) sabe-se arriscada no curto prazo, mas é tida como benéfica a médio/longo prazo.

FC Porto e Sporting partiram de patamares diferentes, mas ambos partilhando a necessidade de destronar o líder Benfica. Os portistas deram continuidade à política de investimentos avultados, alicerçada em vendas exorbitantes e no habitual bom desempenho na Liga dos Campeões. Por outro lado, o Sporting, beneficiando da reestruturação financeira (que julgo levantar inúmeras questões do ponto de vista concorrencial, na relação dos clubes com a banca, e associativo, no que respeita ao controlo do capital da SAD) e da alienação do passe de Marcos Rojo, que desencadeou um diferendo com a Doyen ainda por resolver, ganhou novo ímpeto, decidindo concentrar o seu investimento na contratação do treinador Jorge Jesus e de alguns reforços, esperando que o eventual sucesso desportivo alavanque as receitas operacionais. Para já, o insucesso na eliminatória de acesso à fase de grupos da Liga dos Campeões constituiu-se como um percalço, senão mesmo um sério revés, nesta pretensão.

No fundo, de um lado, assistimos a uma mudança radical de estratégia, que até poderá ser entendida por conservadora, se a considerarmos somente no plano do investimento. Do outro, verificamos um aparente “all in”, repetido nas Antas e agora aplicado também em Alvalade. Qualquer destes posicionamentos acarreta riscos.

Começando pelo Sporting, afastado há treze anos do título nacional e o que se encontra na situação mais delicada, é, actualmente, o exemplo perfeito da ideia de que, para os adeptos, o futebol é o momento e o que interessa é ganhar.

A liderança do campeonato relega, para segundo plano, as eventuais consequências que poderão decorrer da aposta encetada para 2015/16. Na época passada, a Sporting, SAD facturou 58.4M€ na sua actividade operacional, excluindo transacções de jogadores. Cerca de 24,6% destas receitas provieram directamente da participação na Liga dos Campeões (apuramento para a fase de grupos - 8.6M€; participação na fase de grupos – 2.5M€; market pool – 2.19M€; bilheteira – 1.14M€). Logo neste item, e apesar dos novos montantes distribuídos pela UEFA beneficiarem os clubes eliminados na fase de apuramento, prevê-se uma diminuição acentuada nas receitas obtidas na edição da presente temporada.

A acentuar esta tendência está a inexistência de um main sponsor, o que resultará, provavelmente e caso não seja angariado um entretanto, numa quebra dos proveitos de patrocínios e publicidade. Está por avaliar o impacto deste facto nas receitas operacionais, mas estimo que rondará os 5% relativamente a 2014/15.

A compensação destas quebras de receitas poderá resultar de medidas diferentes. Desde logo a mais arriscada: manter o nível de investimento, responder às necessidades de tesouraria com recurso a capitais alheios e aguardar por um hipotético sucesso desportivo que, por sua vez, potencie o crescimento das receitas na próxima temporada. As restantes medidas passarão pela redução de custos e/ou pela alienação de passes de atletas, o que, no plano teórico, diminui a capacidade competitiva do plantel.

Neste contexto, não será exagerado afirmar que o Sporting se encontra refém de um bom desempenho desportivo (apuramento directo para a Liga dos Campeões 2016/17), até porque, no que se refere aos custos operacionais, prevê-se uma subida significativa. Só com o seu treinador principal, fazendo fé no que foi avançado pela comunicação social, a Sporting, SAD terá um custo (5M€) quase duas vezes e meia superior ao de toda a estrutura técnica da época transacta (2.03M€). Por outro lado, sem dados disponíveis que permitam confirmar o que não passa, neste momento, de uma mera suposição, creio que, tendo em conta algumas das contratações efectuadas, a massa salarial do plantel terá crescido.

Finalmente, não se prevendo nova reestruturação financeira (proveito financeiro devido à actualização financeira de activos e passivos não correntes - 13.3M€) e verificando-se a possibilidade de uma condenação de pagamento de indemnização à Doyen (segundo a comunicação social, foi pedida uma indemnização de 22M€), será interessante observar que medidas serão tomadas pela Sporting, SAD para não voltar a apresentar resultados negativos.

Da FC Porto, SAD, pouco haverá a acrescentar relativamente a temporadas anteriores. Pelo que nos é permitido observar, o seu modelo de negócio é há muito conhecido e tem sobrevivido aos mais variados avisos de uma “iminente implosão”. Grosso modo, o investimento é, sucessiva e aparentemente, acima das suas possibilidades, embora compensado por bons desempenhos frequentes na Liga dos Campeões e, sobretudo, com muitas vendas de jogadores, algumas delas por montantes recorde. Passa, no entanto, um pouco despercebido, que, ciclicamente, a FC Porto, SAD abrande o investimento numa temporada subsequente a anos de sucesso no plano nacional. Foi assim no início do milénio, em 2004/05, em 2009/10 e em 2013/14, curiosamente, sofrendo sempre consequências nefastas no âmbito desportivo.

2014/15 foi, por isso, surpreendente. A FCP, SAD apresentou o maior orçamento da história do futebol português, não sendo capaz de impedir que o Benfica revalidasse o título nacional. Do ponto de vista financeiro, mesmo com receitas superiores a 40M€ da Liga dos Campeões (a FCP, SAD, ao contrário da SLB, SAD, contabiliza o proveito quando é obtido e não quando é recebido, o que, devido à disputa do acesso à fase de grupos da Liga dos Campeões em 2014/15, acumulou esta receita com a de 2015/16, além dos prémios por ter alcançado os quartos-de-final e a bilheteira), e das mais-valias recorde decorridas da alienação de passes de atletas (82.5M€), teve um lucro de “apenas” 19.35M€.

Este resultado ficou aquém do que, em circunstâncias normais, se poderia esperar. No entanto, os quase 70M€ despendidos em gastos com pessoal (54.1M€ nas remunerações dos treinadores e atletas) contribuíram decisivamente para um prejuízo operacional (sem transacções de jogadores) superior a 17M€. O percurso na Liga dos Campeões na presente temporada, a venda de Alex Sandro por 26M€ e a contratação de vários atletas, parecem demonstrar que o FCP não alterou a sua estratégia e, consequentemente, renovam-se os tais avisos de “iminente implosão”. Com tantos já efectuados, será grande o estrondo se alguma vez se revelarem acertados.

Por último a SLB, SAD, que implementou, na última década, uma estratégia semelhante à empreendida pela FCP, SAD, embora partindo de um patamar competitivo nitidamente inferior. O enorme investimento ao longo dos anos permitiu ao Benfica recolocar-se na rota dos títulos. Recuperada a credibilidade e criadas as condições para a potenciação da facturação (infra-estruturas, marketing e competitividade da equipa), contou com a sua enorme massa adepta para se destacar na captação de receitas operacionais. O esforço no desenvolvimento de negócio (significativamente atrasado em relação à concorrência há 15 anos), teve consequências positivas e negativas, nomeadamente, por um lado, o aumento da competitividade desportiva e da capacidade de angariação de receitas (102M€ de proveitos operacionais sem transacções de passes de atletas em 2014/15), e, em sentido oposto, no crescimento do passivo (mas na época passada reduziu 4,7%).

O aumento de receitas operacionais, conjugado com a diminuição dos custos sem que a competitividade da equipa de futebol baixe, parece ser, de resto, o desafio que a SLB, SAD se propôs na presente época. Creio que, no final de 2015/16, tanto a subida das receitas como a descida dos custos serão alcançadas. E presume-se que a aposta na formação será para continuar (menores custos na aquisição de atletas, diminuição das amortizações de passes, menor massa salarial e potencial crescente de obtenção de mais-valias superiores na venda de jogadores). Por perceber estarão as consequências no que diz respeito à competitividade da sua equipa de futebol.


Termino recuperando a ideia central sobre os adeptos de futebol… O que interessa é ganhar! O Benfica venceu dois anos consecutivos, logo tem espaço para tentar mudar o paradigma do seu modelo de gestão. Daqui por quatro ou cinco anos, saberemos se terá sido uma aposta consistente e se a mesma se terá revelado, desportiva e financeiramente, bem-sucedida ou não.

Vida Económica - 20/11/2015

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