segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

O maior que não o é, quanto mais ser o melhor…

Desde que escrevi a minha última crónica no Vida Económica, publicada a 11 de Dezembro último, a vertente do “futebol negócio” foi dominada pelos acordos celebrados por vários clubes para a cedência da exploração dos direitos televisivos.

Estes anúncios limitaram-se a um comunicado inicial, o que não deixa de ser surpreendente pela parafernália mediática gerada, com pouca informação e muita desinformação, não se conhecendo ainda, no momento em que escrevo esta crónica, pormenores relevantes destas operações.

Apesar dos propalados “maiores negócios” das SADs de FC Porto e Sporting, mantenho o que escrevi em Dezembro: A Benfica, SAD fez um excelente acordo. É certo que a duração do contrato de dez anos (três anos, podendo ser renovado anualmente nos sete anos seguintes desde que pelo menos uma das partes assim o entenda) poderá levantar algumas questões pertinentes.

Desde logo por condicionar a gestão dos futuros órgãos sociais do clube (os mandatos têm a duração de quatro anos, as próximas eleições serão realizadas em Outubro de 2016), e também por se desconhecer se o valor potencial destes direitos daqui a 6 ou 7 anos, por exemplo. Quanto a esta última, convém realçar dois aspectos: Por um lado, faz sentido que o elevado montante global (400M€) seja possível por se tratar, precisamente, de um negócio de longa duração. A estabilidade na associação das duas marcas confere a confiança necessária ao comprador para investir no curto prazo e recolher os frutos desse investimento no longo prazo. Para a Benfica, SAD, além de mitigar o risco de um eventual declínio do valor dos direitos televisivos num prazo dilatado, e por isso difícil de prever, colhe o benefício de, por exemplo, poder utilizar a elevada receita assegurada enquanto garantia para um possível empréstimo que permita, reduzindo a taxa de juro média, reestruturar o passivo bancário. Por outro, tanto a SAD do FC Porto como a SAD do Sporting cederam a exploração dos seus direitos televisivos pelo mesmo período, mas com início somente em 2018/19, em virtude de, até essa temporada, se encontrarem em vigor outros contratos, o que, numa perspectiva concorrencial entre os clubes, conferirá, ao Benfica, a possibilidade de obter novas receitas anteriormente aos seus rivais.

Finalmente, as receitas da BTV, em 2014/15, totalizaram 34.6M€, o que à primeira vista poderá indiciar que o montante anual obtido a partir da próxima temporada não significará um acréscimo relevante na captação de receitas operacionais. No entanto, os custos com a BTV ascenderam a 11.8M€ (lucro de 22.8M€), sendo previsível que diminuam acentuadamente no novo modelo, já para não referir que, se a BTV quisesse manter o nível de serviço prestado aos seus assinantes, teria que voltar a comprar os direitos da Premier League, os quais significaram um investimento de 3M€/época e, de acordo com notícias veiculadas pela comunicação social, a SportTV pagou 10M€/época para o próximo triénio.

Acresce que o valor médio anual (40M€) está em linha com o objectivo preconizado ao longo dos últimos anos por Luís Filipe Vieira e Domingos Soares Oliveira, conforme se poderá constatar através de uma pesquisa rápida nos mais variados órgãos de comunicação social.

Posteriormente, a FC Porto, SAD anunciou o “maior negócio do futebol português” (457.5M€). Esta afirmação, tão certa quanto enganadora, gerou, numa primeira instância, estupefacção entre os adeptos de futebol. Apesar das rivalidades entre os clubes, creio que há uma noção generalizada do maior potencial do Benfica, dada a sua maior implantação entre as preferências dos adeptos, as audiências televisivas e a média de espectadores no seu estádio. No entanto, conhecidos alguns detalhes do acordo, ficou-se a saber que, além da distribuição do Porto Canal e da cedência dos direitos televisivos, foram incluídos o patrocínio principal da camisola e a publicidade estática, os quais a Benfica, SAD preservou fora do âmbito da parceria com a NOS. Da mesma forma, a Sporting, SAD tentou comunicar, a seu favor, a celebração do “maior negócio da história do futebol português” (515M€), juntando às mesmas rubricas negociadas pela FC Porto, SAD, o remanescente do actual contrato com a PPTV (2015/16; 2016/17 e 2017/18) e o aditamento, totalizando 69M€, o qual, creio, já estava previsto. Ou seja, a cedência dos direitos televisivos, distribuição do canal, main sponsor e publicidade estática foi feita por 446M€, 11.5M€ abaixo da FC Porto, SAD e com uma agravante: a duração do patrocínio principal da camisola é significativamente maior (+5 anos).

Face à inexistência de informação detalhada, torna-se complicado de, num primeiro momento, perceber qual das três SADs fez o melhor negócio, parecendo-me óbvio que a FCP, SAD alcançou um acordo mais vantajoso que a Sporting, SAD. Comparando-os, há três diferenças: O montante total (+11.5M€ para a FCP, SAD), a longevidade do direito de distribuição dos canais de cada clube (+ 6 meses para a FCP, SAD) e a duração do main sponsor (+5 anos para a Sporting, SAD). Sem se saber ao certo quanto valerão cada uma das componentes incluídas, e apesar de, mais uma vez, me parecer óbvio que a FCP, SAD sai beneficiada na comparação com a Sporting, SAD, não se poderá afirmar com a certeza absoluta qual terá sido o melhor negócio. No entanto, tomando por referência a Benfica, SAD, em que se conhece quanto vale cada uma destes itens, é possível repartir o montante global.

Portanto, sabendo-se que o valor médio anual da receita obtida pela Benfica, SAD na cedência dos direitos televisivos e de distribuição da BenficaTV é de 40M€ e que à primeira corresponde 75% e à segunda os restantes 25%, ficamos a saber que a receita média anual dos direitos televisivos é 30M€ e que a distribuição da BenficaTV vale 10M€/ano. Da Emirates, o main sponsor, a Benfica, SAD recebe um valor compreendido entre 8 e 10M€ por ano, consoante o cumprimento de objectivos. E, através da publicidade estática, de acordo com fontes credíveis, a Benfica, SAD obtém uma receita anual a rondar os 2M€.

Ora, num cenário conservador, sem verbas adicionais da Emirates no contrato que termina no final de 2017/18 e sem qualquer aumento de receitas, tanto na publicidade estática como no futuro patrocinador principal (a partir de 2018/19), nas cinco épocas seguintes (2018/19 – 2022/23), cerca de 50M€, aos quais, para se poder comparar com a FC Porto, SAD, ter-se-á que somar 30M€ (24+6) da presente e próximas duas temporadas e considerar que nos cinco anos seguintes (2023/24 – 2027/28), a Benfica, SAD já terá um novo contrato nos últimos três. Ou seja, neste cenário, que não contempla qualquer aumento, mas rejeita igualmente qualquer redução (a tendência verificada é o aumento), a Benfica, SAD facturará mais 22.5M€ que a FCP, SAD em oito temporadas, perfazendo uma média de 2.5M€ anuais (sem contabilizar a diferença entre as receitas de TV e distribuição dos canais até 2017/18!). Fazendo o mesmo exercício comparativo com a Sporting, SAD, atendendo à duração dos contratos estabelecidos pela SAD leonina, a diferença a favor da SAD benfiquista é, naturalmente, ainda mais acentuada (cerca de 11M€/ano).

Face às durações diferentes das várias componentes dos contratos, e para que se possa mensurar cada uma delas nos casos de FC Porto e Sporting, é possível extrapolar a partir do exemplo do Benfica (assumindo o valor médio anual 40M€, o montante mínimo do patrocínio da Emirates e os 2M€ da publicidade estática). Assim, verificamos que os direitos televisivos corresponderão a cerca de 60% do valor total, sendo que ao direito de distribuição do canal caberá 20%. Ao main sponsor 16% e à publicidade estática 4%. Neste cenário, significaria que SLB, FCP e SCP obteriam 30M€, 28M€ e 26.5M€ por ano pela cedência dos direitos televisivos, o que faz suscitar a curiosidade de saber se, conforme noticiado pela comunicação social, o Benfica terá incluído uma cláusula de salvaguarda face aos seus rivais e, em caso afirmativo, qual a percentagem prevista e a que itens se aplica. Se for, por exemplo, de 90% em relação aos direitos televisivos, os “encarnados” terão direito a uma revisão automática do montante acordado com a NOS. Fica ainda a dúvida do que significará “exploração comercial da publicidade no estádio”. Se é, de facto, apenas a publicidade estática ou se inclui, por exemplo, as bancadas.

Uma nota final para a SAD do SC Braga, que cedeu os direitos televisivos à NOS por 100M€ com uma duração de dez temporadas. Comparativamente aos negócios dos “três grandes”, não impressiona. Mas se tivermos em conta que quase triplica o montante do seu contrato em vigor e que, em 2014/15, as receitas operacionais, sem passes de jogadores, pouco mais que ultrapassaram os 10M€ (e no exercício anterior ficaram abaixo dos 9M€), pode-se afirmar que deu um passe de gigante.

Vida Económica - 22/1/2016

Números da semana (171)

1 O Benfica conquistou, pela 1ª vez, a Taça FAP de andebol no feminino; 3 Di María isolou-se na 3ª posição do ranking dos goleadores b...