Por vezes é útil colocarmo-nos no lugar dos outros.
Imaginemos um cidadão português normal que por acaso é portista. À partida será
honesto, mesmo que, por vezes, recorra à chico-espertice, desde que entendida
em abstracto, sem dar um rosto às vítimas. Gosta, como qualquer um, de ter
alegrias e compreende-se que relativize um ou outro comportamento desviante que
coloque em causa a plenitude da sua felicidade. José Maria Pedroto, no final
dos anos 70, inventou o “caso Calabote”, bem melhor, admitamos, que comprimidos
para portistas dormirem descansados.
Desde então, a menção ao quinhentinhos, à agência Cosmos, à
fruta, ao café com leite e outros encontrou sempre na farsa Calabote o
necessário respaldo para os portistas que, de boa fé, celebram o sucesso do seu
clube, o seu próprio sucesso. Nesta temporada, em que rara é a jornada em que o
FC Porto não é beneficiado, as consequências de alguma coisa são evidentes. Só
ainda não sabemos exactamente que coisa é essa. E a inventona Calabote já é tão
velha que de pouco serve.
Mas a metodologia Calabote mantém-se actual. A deturpação do
conteúdo de emails roubados ao Benfica revigorou-a. Para eles é indiferente se
o Benfica condicionou, ou não, o sector da arbitragem. O importante é passar a
mensagem que o actual estado da arbitragem deve ser analisado à luz de um
qualquer papão. Daqui a uns anos, tenho a certeza, ainda descobrirão que
Calabote enviou uns emails em 1959. A lógica, para o tal portista médio que
pretende dormir descansado, é simples: “O Pinto da Costa é um trafulha, mas são
todos”. E, de premeio, ainda se condiciona árbitros menos próximos à causa.
Triste futebol português...
Jornal O Benfica - 5/4/2019
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