Gosto do defeso. Chamam-lhe, com propriedade, silly season – época tonta – apesar das decisões importantes que são tomadas pelos clubes nesta altura. É campo fértil para entusiasmos desmesurados, os fatalismos tendem a esvanecer depressa, a inconsequência das emoções impera. E isso diverte-me.
Acresce o interesse inusitado por eventos cuja relevância é
manifestamente reduzida. Ver futebolistas a correrem à volta do relvado de jogo
torna-se um gerador prolífero de pistas para se adivinhar o onze titular; um
sorriso de um jogador à chegada ao centro de estágio logo é transformado numa
promessa velada de inauditas conquistas; um qualquer pormenor da camisola
alternativa poderá provocar a sensação de que se estará a hipotecar o triunfo dos
títulos almejados.
E há os jogos particulares, em teoria mais propícios ao
estímulo de bocejos, na prática, para alguns, uma plataforma de formação de
opiniões definitivas, para quase todos, desafios de suprema importância,
imperdíveis, bálsamos de vínculo emocional após a inatividade que os confrontos
entre selecções não preenchem.
Nada disto é tonto. É paixão e dedicação, é clubismo, e
pouco será mais importante, para quem o sente, do que o amor por um clube.
Tão importante que são múltiplas as vivências e todas são
válidas. Mesmo aquelas que me chateiam, das quais relevo as norteadas pelo
pessimismo militante exacerbado, imune a sucessos e a provas dadas, mais
enfático no defeso por carência de acontecimentos substantivos. É mais comum do
que se possa imaginar.
Na preparação para cada episódio do programa “A Época em
Revista na BTV”, no qual participo, procuro apreender o estado de espírito da
nação benfiquista ao longo da temporada. Consulto fóruns, vejo os comentários
de cada jogo nas redes sociais e nas notícias online. Após uma época de sucesso
como 2022/23, esta análise retrospectiva torna-se caricata, embora seja
compreensível que, ao longo do ano, seja acentuada a dimensão de escape de
anseios e frustrações.
Menos aceitável é, no entanto, esta mesmíssima postura no
defeso. Não atinge, porventura, uma percentagem considerável de adeptos, mas
fico perplexo com as críticas que vou encontrando a Roger Schmidt, Norberto
Alves, Nuno Resende ou Marcel Matz, só para nomear os treinadores das equipas
masculinas campeãs nacionais.
Bem já me disse o meu pai muitas vezes: um treinador, para
que haja muita gente a achá-lo incompetente, só precisa de vir para o Benfica.
E eu aproveito para parafrasear a Margaret Thatcher, de quem não sou particular
admirador, mas gosto da frase: Se alguns benfiquistas vissem um qualquer
treinador do Benfica a andar sobre o rio Tejo, diriam que o faz por não saber
nadar.
O que vale é que somos tantos benfiquistas que muitos, no
caso do Benfica, pode cingir-se a uma pequena fatia da massa adepta. E sei que
só assim pode ser, tal foi o sucesso em 2022/23.
Jornal O Benfica - 21/7/2023
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